«I too am not a bit tamed, I too am untranslatable» (Walt Whitman) | setadespedida@yahoo.co.uk

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Em cheio

Serão animais selvagens ou domésticos, as setas?
Apesar de ter mudado de endereço e de título de blogue, continuo a encontrar referências a elas por todo o lado. (Até nas Investigações Filosóficas, de Wittgenstein, há algumas reflexões sobre o tema.)
Ontem, por exemplo, observei estas ocorrências no conto «O Burguês Enfeitiçado», do livro Pânico no Scala, de Dino Buzzati (onde, estranhamente, também há um conto com o título «A Terrível Vingança de um Animal Doméstico»):

«Mas ele não reparava nas pessoas, fechado intensamente em si mesmo. E nenhuma das pessoas que passava notava que no meio do peito ele tinha uma seta espetada. Uma vareta perfeitamente torneada, duma madeira aparentemente duríssima e de cor escura, saía-lhe da camisa quase uns trinta centímetros, no centro de uma mancha de sangue. Os olhos de Gaspari fixavam-na com um horror moderado, devido a uma estranha felicidade que se lhe interpunha. Tentara extraí-la mas doía-lhe muito: arestas laterais deviam retê-la dentro das carnes. E da ferida, de vez em quando, borbotava sangue. Sentia-o descer pelo peito e escoar pelo ventre, estagnando nas dobras da camisa.
[…]
Dissera a uma porta secreta abre-te, julgando-se quase brincar, mas a porta abrira-se verdadeiramente. Dissera selvagens e assim acontecera. Seta, por brincadeira, e verdadeira seta o matava.»

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