«I too am not a bit tamed, I too am untranslatable» (Walt Whitman) | setadespedida@yahoo.co.uk

sexta-feira, 24 de março de 2017

Spoilers


Algumas pessoas prefeririam não conhecer o futuro se lhes dessem essa hipótese.  Há quem se irrite com qualquer spoiler sobre o filme que vai ver. Certos pais optam por não conhecer o sexo dos bebés antes de eles nascerem. Se a medicina já conseguisse realmente adivinhar as doenças de que vamos sofrer, será que toda a gente procuraria saber?

Os  extraterrestres do filme Arrival (Dennis Villeneuve, 2016) têm uma concepção não-linear do tempo. Visto que, para eles, passado, presente e futuro existem no mesmo plano, estes extraterrestres sabem o que acontecerá se determinada escolha for feita.

Se pensarmos bem, no entanto, a concepção humana do tempo não é muito diferente da destes extraterrestes. Graças à memória, as pessoas já têm uma concepção não-linear do tempo. Só raramente a vida é uma completa surpresa. As escolhas que fazemos baseiam-se na informação que recolhemos e nas projecções que fazemos. Por isso, é frequente adivinharmos o futuro. Muitas vezes intuímos o que vai acontecer a partir de conhecimentos prévios ou experiências passadas semelhantes. As premonições que temos não são sobrenaturais nem sobre-humanas, mas sim baseadas no conhecimento adquirido através da experiência.

Sucede, contudo, que mesmo prevendo que certas escolhas terão finais infelizes, algumas pessoas preferem vivê-las. Em certas relações de amor ou amizade notam-se sinais evidentes logo no princípio de que as coisas acabarão mal, mas há quem prefira experimentar. No filme Arrival, ainda que saiba que se tiver uma filha esta morrerá jovem, com uma doença raríssima, a protagonista decide ter a criança. O que faríamos se conhecêssemos o enorme risco de virmos a morrer de determinada doença?

Umas vezes fazemos tudo para nos protegermos do final infeliz, evitando determinadas opções. Se outras, todavia, insistimos em más escolhas, não o fazemos por acreditarmos em milagres nem em reviravoltas inesperadas, mas sim por não abdicarmos das pequenas felicidades associadas aos erros. Se calhar os extraterrestres comportar-se-iam de modo diferente.
 
 

Arquivo do blogue