Uma das sequências mais inesperadamente belas do filme desenrola-se no mercado de Marraquexe. A dada altura, por entre o caos de comerciantes, carregadores, marroquinos e turistas de várias nacionalidades, chama a atenção das personagens uma perseguição. Apesar de inicialmente ser observada ao longe, esta desordem vai-se aproximando gradualmente dos protagonistas, a ponto de, depois de ser atingido nas costas com uma faca, o perseguido vir, inesperadamente, morrer nos braços de James Stewart, que só tem tempo de lhe amparar o rosto com as mãos.
É um momento imprescindível para a progressão narrativa do filme: antes de morrer, a vítima, que afinal é um espião, revela um segredo de de que dependerá toda a restante acção do filme. Nestes momentos cruciais, Hitchcock, no entanto, não hesita em recorrer a planos absolutamente destituídos de qualquer contributo especificamente narrativo.
As mãos de James Stewart sujas de maquilhagem, a mancha azul nas costas da mão do espião,
destacam-se como fragmentos desarticulados da continuidade da acção, manchas vazias, gratuitas, episódios sensoriais que captamos antes de percebermos exactamente para que servem, o que são.
Pouco depois, neste filme, já em Londres, também gosto muito da visita de James Stewart ao taxidermista, toda uma sequência desnecessária do ponto de vista da progressão narrativa.
Interpretando mal uma indicação, James Stewart, em busca de informações sobre o filho sequestrado, faz uma visita a uma pessoa que depois descobre ser o proprietário de um estabelecimento de taxidermia. A troca de mal-entendidos que se processa no estranho espaço, com os animais empalhados e as movimentações dos funcionários em pano de fundo, é absolutamente hilariante. A dada altura, proprietário e funcionários começam a desconfiar do inocente James Stewart e a discussão intensifica-se.
James Stewart, ainda mais confuso do que antes, vê-se obrigado a fugir. A acção principal do filme pode, então, prosseguir.