«I too am not a bit tamed, I too am untranslatable» (Walt Whitman) | setadespedida@yahoo.co.uk
quarta-feira, 30 de julho de 2008
Abandonados
quarta-feira, 23 de julho de 2008
Vivem em nós inúmeros
Só em filmes como Margot at the Wedding, em que aparece com um aspecto ligeiramente diferente do habitual e assume personagens pouco convencionais, consigo reencontrar a memória da imagem dela pré-cirurgias.
Gostei muito de a ver em Fur, por exemplo (que quase toda a gente detestou, já sei, mas eu não). Na altura até guardei esta fotografia que saiu na Vanity Fair da actriz enquanto Diane Arbus. O cabelo, a posição das mãos, o olhar mal domesticado lembram-me coisas em que acho saudável pensar de vez em quando.
sábado, 19 de julho de 2008
I remember you well
Nem sempre fui a péssima ouvinte de música que hoje sou mas nunca fui uma melómana fiável. Quando compro um disco, encontro invariavelmente uma ou duas faixas que ouço em repeat até à exaustão, esquecendo as outras. Não é bonito.
Vivo numa casa com muitos discos de Leonard Cohen, mas não acho que ele seja «um dos maiores artistas de sempre», como ouvi anunciado na televisão a propósito do concerto de hoje. (Prefiro, sei lá, Proust e Miguel Ângelo.) Nem sequer gosto especialmente da voz dele. Ouço muitas vezes First We Take Manhattan e Famous Blue Raincoat, mas, sacrilégio pop, optando frequentemente pelas versões de Jennifer Warnes. É verdade que certo Verão pouco mais ouvi para além da faixa Take This Waltz; hoje, contudo, não consigo ouvi-la duas vezes seguidas.
Imagem de Linda Troeller
Seria incapaz de comparar a audição de um disco a uma experiência religiosa. A única experiência religiosa de que me lembro é a de ter desmaiado numa igreja na adolescência durante uma missa a que assisti sem tomar o pequeno-almoço, depois de uma noite com poucas horas de sono, num dia muito quente, ao mesmo tempo que estranhamente me recordava de uns versos de Chuva Oblíqua.
Para momentos mesmo críticos, reconheço, no entanto, que guardo no computador uma pasta com algumas músicas que não só me desconcentram como perturbam os gatos, não podendo ser ouvidas a não ser com um volume bastante elevado. E uma delas, por acaso, é de Leonard Cohen.
PS: Nada a fazer, Henrique. O problema é a minha alma ter um fundo pop que não consigo ignorar e com que, para dizer a verdade, até simpatizo.
quinta-feira, 17 de julho de 2008
Of taxis and cats
- os que cobram legitimamente uma taxa de cerca de quatro euros para transportar dois gatos (dois euros por cada, a lei assim o permite);
- os que cobram apenas dois euros ainda que transportando dois gatos;
- os que não cobram nada.
Ter ou não ter gatos é estranhamente irrelevante para a equação. Os que cobram a taxa na totalidade são por vezes orgulhosos e conversadores donos de gatos .
E você, caro leitor, se fosse taxista, quanto cobraria?
segunda-feira, 7 de julho de 2008
A natureza do lugar
Conheci em tempos uma pessoa que sempre que havia derramamentos de petróleo no oceano começava o dia de trabalho analisando nos jornais a progressão da mancha em direcção à costa e os efeitos destrutivos da catástrofe ecológica, como se esses percursos lhe revelassem coisas sobre a própria vida.
sábado, 5 de julho de 2008
A senhora da romã
Gosto muito da noção de alguém a descrever uma pessoa que o interessa apesar de não corresponder a padrões convencionais. Tenho pensado nisto porque, um pouco por acaso, venho ultimamente encontrando várias descrições de beleza feminina imperfeita nas coisas que ando a ler.
Não me consigo lembrar de muitos retratos deste género e tenho até a suspeita de que só grandes escritores são capazes de captar de forma superior não só a mistura subtil de atracção e repulsa suscitada por um objecto de desejo imprevisto, mas também a investigação que tal desconcerto pode desencadear.
Na descrição de Nabokov gosto da noção de expansão desordenada da carne:
(Cotovia, trad. Ernesto Rodrigues, D. Quixote, p. 89)
sexta-feira, 4 de julho de 2008
Animais com gatos
Eu própria venho de um sítio onde ainda conheci mulheres capazes de percorrer dois quilómetros a pé equilibrando sobre a cabeça um recipiente com flores para vender ou para enfeitar campas no cemitério. Independentemente da idade, tinham os pescoços mais elegantes que já vi.
Segundo o autor da peça, o gatinho da imagem representa uma homenagem bem-humorada aos bibelôs domésticos e à sua capacidade de ignorar elementos como gravidade, escala e leis da natureza, mas não me venham dizer que não andamos todos por aí com coisas estranhas, em equilíbrio precário, sobre a cabeça. Dá-se simplesmente o caso de ninguém as ver.